Com alguma frequência, a propósito dos fogos deste ano, tem sido pedido à Montis que ajude aqui e ali.
Temos tentado sempre dar respostas ao que nos pedem, dentro do que são os princípios gerais de actuação da Montis, avaliando em concreto o que está em causa e procurando que os recursos que existem sejam usados da forma mais estratégica possível.
A fotografia que começa esta post é da linha de água que faz a estrema de uma das propriedades que a Montis comprou com recurso a uma subscrição pública e mostra bem que a afectação do fogo de 15 de Outubro parece ter sido bastante maior do que estaríamos à espera: trata-se de uma linha de água, sem água corrente neste ano, mas ainda com humidade suficiente para ter algumas poças de água, como se vê na fotografia.
Nestas circunstâncias o normal seria esperar uma afectação menor da vegetação. É certo que a verdadeira afectação só pode ser avaliada depois da Primavera, mas desde já é visível a vegetação ribeirinha calcinada, o que não é assim tão habitual.
A fotografia seguinte ajuda a fazer uma melhor interpretação do que terá acontecido.
Neste caso o vento (e, consequentemente, o fogo) terá vindo de montante para juzante (na primeira fotografia, da esquerda para a direita, o que é confirmado pela observação local dos troncos, mais escuros do lado de onde vem o fogo), era um vento muito forte e terá sido canalizado pelo forte encaixe do vale neste ponto.
Ao olhar para o conjunto (a área da primeira fotografia está no canto inferior esquerdo da segunda fotografia), parece confirmar-se essa hipótese na medida em que à medida que o vale desce, e logo que se alarga, o grau de severidade do fogo visível na vegetação da linha de água parece diminuir, ao ponto de, mais à frente, já se encontrar um povoamento (neste caso, de eucaliptos) bastante menos calcinado.
Seria completamente abusivo concluir que porque os carvalhos da parte inferior esquerda da fotografia estão completamente calcinados e os eucaliptos da parte central da fotografia mantêm a folha, os carvalhos ardem mais ou mais intensamente que os eucaliptos.
O que é preciso é procurar entender os processos complexos associados ao fogo e os processos, ainda mais complexos, porque muito mais estendidos no tempo, que estão associados ao pós-fogo.
Do ponto de vista da Montis a situação, nos seus terrenos, é relativamente clara: o trabalho de preparação que fizemos antes do fogo não parece ter tido muita relevância na evolução do fogo, o que só pode ser correctamente avaliado depois da Primavera, mas a informação que existe permite dar como provável essa hipótese.
Provavelmente esse relativo falhanço do trabalho que fizemos está relacionado por um lado com a intensidade do fogo, que tende a diminuir a diversidade de situações, por outro havia pouco tempo de evolução entre os trabalhos e o fogo, o que limita os efeitos do trabalho feito: a natureza precisa de tempo para se revelar.
Isso não invalida o que aprendemos e o que podemos discutir sobre o que fazer depois do fogo.
Por isso temos, desde o primeito momento, estado discretamente envolvidos no processo de defesa da aldeia da Ferraria de São João, com algumas naturais diferenças de perspectiva e opinião que de maneira nenhuma invalidam uma colaboração útil para todos, por isso temos estado envolvidos na discussão do futuro do Parque Natural Vouga/ Caramulo, em Vouzela (onde pensamos que existem hoje boas condições para o desenho de uma programa de fogo controlado, à escala da paisagem, que minimize o risco dos fogos futuros terem consequências tão negativas como tiveram os de 15 de Outubro) e várias outras iniciativas.
Ainda há muita informação que nos falta, ainda há muita coisa que não sabemos, mas de uma coisa estamos bem seguros: razão tem Nuno Gracinhas Guiomar quando chama a atenção para que o problema central não está em responder ao fogo com grandes programas de reflorestação, o problema central está em responder ao fogo gerindo o que vai aparecer, por semente ou rebentação, sem que ninguém faça nada para isso.
Gerir o que aí vem é muito, mas muito, mais importante que plantar muitas árvores sem que se saiba muito bem como vão ser geridas nos próximos dez a quinze anos, até ao próximo fogo.
Seria muito bom que a natural comoção com o que aconteceu, e a vontade de ajudar que é evidente, fosse orientada para coisas verdadeiramente úteis nos próximos dez anos, e menos para acções pontuais, meritórias, sem dúvida, mas sem futuro assegurado, evitando-se assim o desperdício de recursos, dos quais a boa vontade é seguramente o mais valioso.