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Esta fotografia de Manuel Rainha (penso que uma frame de um video) foi-me mandada por Paulo Fernandes e diz respeito a uma área ardida em Agosto de 2016, nos grandes fogos da Arouca e São Pedro do Sul.
No primeiro plano da fotografia temos, à esquerda, uma área que tinha sido queimada com um fogo controlado em 2015 e à direita uma área que não tinha sido queimada, isto é, a fotografia retrata exactamente a linha de separação entre área de fogo controlada e a área não intervencionada.
Para se ter uma percepção melhor do que pode significar essa linha de contacto, talvez seja útil olhar para esta fotografia, tirada anteontem, na área em que a Montis fez um fogo controlado há mês e meio.

 Note-se que nesta fotografia apenas passou um mês e meio desde o fogo controlado e a fotografia foi tirada exactamente para retratar uma pequena área em que, ao contrário dos restantes vinte hectares, praticamente não são ainda visíveis sinais de regeneração da vegetação, mas para o que interessa agora o relevante é a diferença de carga combustível que marca o limite do fogo controlado.
É por isso que na fotografia inicial do post (e que as duas seguintes pormenorizam), oito meses após o fogo de Agosto, é bem visível a resposta da vegetação (e o efeito no solo) às diferentes características que o mesmo fogo adquiriu quanto tinha combustível abundante disponível (o lado direito da primeira fotografia e a fotografia imediatamente abaixo deste parágrafo) ou quando tinha havido um gestão de combustíveis adequada, com recurso ao fogo no tempo e nas condições escolhidas para o fogo controlado.

A Montis tem recebido alguns comentários sobre o fogo controlado que fez há mês e meio, manifestando reservas de alguns sócios face ao uso desta técnica ancestral, reflectindo a ideia generalizada de que o fogo é um elemento estranho aos sistemas naturais e que os prejudica.
Na verdade, apesar de muito generalizada, esta ideia está longe de estar certa, como há milhares de anos se sintetizou na Grécia, na famosa definição dos quatro elementos naturais essenciais: o ar, a água, a terra e o fogo.
Sabendo que dificilmente podemos gerir o ar (embora o possamos conhecer para o usar adequadamente, como quando escolhemos queimar em determinadas condições de vento e humidade atmosférica), temo-nos centrado na gestão dos outros três elementos como instrumentos de construção da paisagem e do mosaico de vegetação que nos permita ter muito mais biodiversidade, e uma biodiversidade muito mais valiosa que a que se consegue obter gastando rios de dinheiro e trabalho a procurar eliminar o fogo dos sistemas naturais, sem resultados e, já agora, sem base técnica e científica.
A fotografia abaixo, menos expressiva que as outras, ilustra o que pretendemos dizer: no primeiro plano, a área onde ocorreu o fogo controlado da Montis há um mês e meio, com uma boa regeneração da vegetação e no último plano temos uma encosta percorrido pelo mesmo fogo a que dizem respeito as fotografias de Manuel Rainha, há oito meses, com a regeneração que se pode esperar de um fogo de alta intensidade que ocorre em condições meteorológicas extremas: os fundos dos vales com um início de recuperação e as área mais convexas ou de grande declive quase sem sinais de regeneração, ainda (uma maior aproximação demonstraria que mesmo aí está a ocorrer alguma recuperação, mas mais lentamente).

A oficina de engenharia natural do fim de semana de 22 e 23 de Abril, o fim de semana voluntário que estamos a preparar numa organização conjunta com a Plantar uma árvore far-se-ão exactamente nestas áreas percorridas pelo fogo controlado (no caso do fim de semana voluntário, apenas parcialmente, para que exista maior diversidade de actividades), tirando partido das oportunidades que o uso sensato do fogo cria, tendo como objectivo gerir a transição entre a actual situação de giestal contínuo para uma situação de mosaico com forte presença de matas de folhosas autócotones.
Não é para amanhã, mas o caminho é seguro para lá chegar.
henrique pereira dos santos

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